Esse texto ora terá tons de confessionário, em que relatarei minhas experiências individuais como se fossem suas, ora terá tons de desabafo sobre os males atuais dessa geração sofredora.
Infundir-me-ei em memórias e projeções de um passado que por muito tempo vivi sem me dar conta de que logo ele se transformaria num futuro que quis evitar.
(...) Os outros podem dar-lhes um nome ou um número, mas não podemos jamais dizem quem são vocês. É coisa que só mesmo cada um pode descobrir interiormente.~ Thomas Merton, em "Homem Algum é uma Ilha" (1955)
Ela: Cara, tu quer perceber o quanto a nossa sociedade está doente Mauro?
Eu: Han, por quê?
Ela: Porque é domingo, seis horas da tarde, e essa academia está lo-ta-da.[1]
Típico. E nós também estávamos lá. O que me fez perceber que eu também devo estar doente, mas insisto na pergunta: por quê?
Há várias luas atrás eu me peguei pensando em quanto vinha se tornando cada vez mais difícil manter contato com os bons e velhos amigos.
O efeito, porém, foi ralo comparado ao que eu esperava.
De fato, todos andamos ocupados. Eu estive bastante ocupado também em 2025.
Os seus 20 anos são o momento da vida em que na minha infância eu me perguntava: "o que as pessoas dessa idade estão fazendo?"
Agora os de 20, cadê?
Essa idade marca o momento da sua pós-adolescência aparentemente.
Como fazer para ser visto? Como serei lembrado? Quem são meus verdadeiros amigos? Onde estão as pessoas que acreditavam no meu potencial? Será que eu mesmo ainda acredito nisso?
E, para piorar, a humanidade vive hoje a fase mais decadente das redes sociais desde a invenção dos smartphones, lá pelos idos de 2007 - a gentrificação extrema da coisa.
É isso mesmo: vender coisas e serviços nas redes sociais é como alugar um ponto comercial numa rua do centro - você se encontra ao lado de outras lojas nada a ver com a sua, em um prédio que não é seu, numa rua que você mal sabe o endereço ou como funciona o tráfego, e a cada dia que passa o aluguel fica mais caro e as ruas mais apinhadas - não de gente ou de clientes, mas de outros lojistas querendo por uma banquinha na frente da sua.
Esse esquema, ora falho, ora de pirâmide, torna míope a visão do que realmente vemos no espelho.
Algumas pessoas ora aprendem a ser editoras de sua própria câmara caleidoscópica.
Parece até que esse sentimento de impotência é propositalmente desenhado em nossos espíritos, não é mesmo?
Pois bem, anteriormente eu disse que tudo que as pessoas de 20 anos têm é o seu furor e energia.
Charme. Trato. Etiqueta. Bom senso. Flexibilidade. Agilidade cognitiva.
Eu não sei como resumir tudo isso em uma palavra, por lentidão cognitiva a minha, perdão.
Piotr Wozniak[3] fala que aos 23 pode até ser tarde para uma reforma pessoal, mas ele mesmo conseguiu reformar-se nessa idade.
Luke Burgis[4] conta como sua vó decidiu se tornar artista depois 40 anos de idade, largou tudo o que tinha e foi fazer um curso de escultura numa das melhores faculdades para artistas do seu estado.
Já Melanie Klein fala que o Complexo de Édipo em uma pessoa já começa a se manifestar em seus dois, três meses de idade[5].
Aleander Cortes conta que seu pai resolveu fazer medicina aos 40 anos, se formou na faculdade aos 47, e hoje com 67 está há 20 anos exercendo a profissão[7].
Brian Roemmele fala que ao longo da vida passaremos por não uma, mas várias crises de meia-idade.
Enfim. Dentre a opinião dos que falam que depois da sua primeira dor na lombar é ladeira abaixo, e a dos que falam que nunca é tarde para dar uma alongadinha e mudar sua vida, eu, como um ávido praticante de mobilidade e ioga, fico com a segunda turma.
E sendo eu, um otimista irreparável, muitas vezes peco pela lentidão em perceber que algumas coisas na minha vida precisam mudar.
E se você leu esse texto até aqui, acho que você tem um pouco disso também.
Viver não basta. Conviver é preciso.
Até a próxima. Viva bem, Mauro.